Nampula (IKWELI) – Localizado a mais de 140 quilómetros da cidade de Nampula, a Reserva Florestal de Mecubúri, no distrito com o mesmo nome, tem s
Nampula (IKWELI) – Localizado a mais de 140 quilómetros da cidade de Nampula, a Reserva Florestal de Mecubúri, no distrito com o mesmo nome, tem sido, recorrentemente, invadida por madeireiros furtivos, que a meio a proibições abatem espécies e proibidas por lei.
Esta actividade dos furtivos desafia a capacidade das autoridades governamentais locais, e não só, na garantia do cumprimento rigoroso de normas oficiais, incluindo a legislação do sector em vigor.
Uma investigação levada a cabo pelo Ikweli naquele ponto da província de Nampula constatou que para garantirem o transporte destes produtos florestais, os madeireiros furtivos acabam corrompendo funcionários públicos, incluindo as lideranças locais.
Líderes comunitários localizados na zona tampão da reserva afirmam que recebem benesses diversos, incluindo motorizadas, para facilitar a vida dos furtivos. Eles dizem que aceitam porque a vida está difícil naquele ponto do país.
Um estudo feito em 2020, por uma publicação brasileira denominada Revista Sociedade e Território do Rio Grande, sugere que naquele ano uma grande área florestal sofreu desmatamento bruto, sobretudo na região norte do distrito, mas anota que de 2002 a 2020 havia um exagerado corte de madeira de 2.165 hectares por ano.
Esta realidade é agravada pela fraca efectivação do plano de recuperação das áreas em devastação, primeiro pelo facto da falta de interesse dos madeireiros e de seguimento das autoridades governamentais além do desconhecimento desinteresse das lideranças comunitárias, estas últimas acusadas de facilitar a exploração ilegal em troca de irrisórios valores monetários.
Com uma área de 230.000 hectares, a Reserva Florestal de Mecubúri correspondente a um triângulo Mecubúri-Muite-Imala. Todavia, devido a invasão humana para dentro da reserva, cerca de 35.200 hectare de terra tiveram que ser desanexada para a produção de algodão e construção de habitação. Esta invasão humana com uma taxa normal de crescimento de 2.5% ao ano tem tendência a aumentar ao longo do tempo devido a ineficiente fiscalização no local (Awasse & Mushove 2000, citados e Sitoe at al 2007) e reforçada pela Política e Estratégia de Desenvolvimento de Florestas e fauna Bravia (Decreto 8/97 de 01 de Abril).
A Reserva Florestal de Mecubúri é de acordo com alínea 32 do artigo 1 e artigos 10 uma zona de protecção e reserva nacional; de acordo com o artigo 12 ambos da Lei 10/99 de 7 de Julho, Lei de Florestas e Fauna Bravia, isto é, um espaço territorial que se destina a preservação de certas espécies de flora, fauna raras, endémicas, ameaçadas ou em via de extinção, ou que denunciem declínio, e os ecossistemas frágeis. De acordo com a mesma lei, a Reserva Florestal de Mecubúri, classifica-se como uma Floresta de Conservação (alínea a) do artigo 5) e não floresta de utilização múltipla (alínea c) do artigo 5) e muito menos floresta produtiva (alínea b) do artigo 5)
“Queremos comer”
Um líder comunitário entrevistado pelo Ikweli afirmou que tem cooperado com os madeireiros furtivos, mas justifica que o faz porque os pagamentos que ganha não o têm o ajudado.
“Como vês aqui estamos mal, não temos alternativa a nada. Muitas coisas devem vir da cidade e nós não temos dinheiro para ir lá comprar, então quando vêm um madeireiro e nos dá alguma coisa, aceitamos cooperar com ele”, disse um régulo que nos pediu a proteção da sua identidade.
Esta mesma fonte recorda que “no passado nós agarrávamos estes madeireiros furtivos, mas quando entregávamos aos fiscais eles dispensavam-nos porque cobravam dinheiro”.
Um outro líder, próximo a comunidade de Milhana disse que “o Governo e os seus técnicos não ajudam, não melhoram nada nas nossas comunidades e nós não vamos viver na miséria enquanto temos recursos, então quando o madeireiro chega com dinheiro, roupa, mota e outras coisas não negamos. Recebemos e eles cortam a madeira que querem”, questionando ser necessário “saber onde eles passam até chegarem aos seus estaleiros, o que quer dizer que, também, pagam aos fiscais por onde passam”.
Uma senhora, também, residente na zona tampão, refere que “os furtivos dão emprego aos nossos maridos. No momento que vêm tirar madeira, eles contratam as pessoas daqui para ajudarem a cortar madeira e em troca pagam dinheiro e dão peixe seco”.
Na comunidade de Mualua, uma fonte contou ser desafiante combater a invasão à reserva, porque “todos queremos comer”, não só as comunidades, como também agentes do Governo.
“La em Nampula [cidade] há chefes que confiam nisso para as suas vidas andarem, por isso nunca vais ouvir eles a falarem seriamente sobre combater os furtivos aqui. Sempre que há missão todos os furtivos desaparecem”, referiu um residente da comunidade de Poupe, o qual acredita que “essas pessoas passam informação para os furtivos fugirem”.
Em Munhumua, por exemplo, um líder local disse que “temos interesse em combater, mas nós nem estrada temos, os serviços básicos não funcionam, então vale a pena permitir pessoa que nos traz comprimidos da cidade entrar e cortar, do que seguir ordens de um governo que nos esqueceu”.
Acompanhamos igualmente, o mesmo posicionamento na comunidade de Muralene, onde um líder comunitário apontou que “fomos abandonados. A única pessoa que vem aqui e nos trata bem é o madeireiro furtivo. Traz comida, óleo, açúcar e sal para nós”.
A dona Madalena reside em Munhumua e diz que para ter acesso aos serviços básicos, sobretudo os de saúde materno infantil deve percorrer quilómetros.
“Aqui nem parece que temos recursos. Ninguém olha por nós. As mulheres passam mal para ter consultas pré-natais. Os nossos maridos devem se sacrificar em nos levar na bicicleta”, conta.
Esta mesma fonte afirma que “mesmo na vila os serviços não são de qualidade, só não temos alternativa só”.
Uma outra residente da mesma comunidade, Julieta Rodrigues, diz que “a situação aqui não é das melhores. Tiram nossa madeira aqui, mas não conseguem nos dar escolas e nem hospitais de qualidade. Sofremos muito”.
Em Mualua, por exemplo, uma parteira tradicional referiu que “aqui os que mais sofrem são as mulheres, porque não há condições para terem um parto seguro”.
Há fraca capacidade do Governo em controlar
O assunto é do conhecimento pleno das autoridades do distrito de Mecubúri. O director dos Serviços Distritais de Actividades Económicas (SDAE), João Mezicue, afirma que a exploração ilegal dos recursos florestais é, por um lado, devido a fraca capacidade que o governo tem em termos de intervenção, com destaque para exiguidade de recursos humanos, neste caso, os fiscais.
“Há um trabalho que tem sido feito a nível do distrito, primeiro quero aqui reconhecer a fraca capacidade em termos de intervenção. Porquê estou a dizer isso? O número de ficais é exíguo” explicou Mezicue, apontando que o número alocado não cobre para dar resposta a fiscalização dentro e fora da Reserva de Mecubúri. “Estamos a falar que, em média, segundo plano da Agência Nacional para o Controlo da Qualidade Ambiental (AQUA), temos recebido dois (2) à (3) fiscais para fazer valer aquilo que são nossas obrigações em termos de fazer vigilância na nossa reserva”.
A fonte apontou, como outros factores que justificam a incapacidade das autoridades em conter a acentuada exploração de madeira em Mecubúri, a insuficiência de meios de transporte para uma resposta rápida. “Assim como o distrito e a Direção do Meio Ambiente que não dispõem de muitos recursos, estamos a falar de meios de transportes para a intervenção rápida, mas em coordenação com alguns comités de gestão instalados”.
Os problemas que influenciam a fraca resposta quanto a exploração ilegal de madeira em Mecubúri, também advém de falta de benefícios para a comunidade, mesmo em casos dos madeireiros legalmente apresentados às autoridades.
O director do SDAE de Mecubúri diz que no passado, 2022, muita madeira foi explorada por madeireiros licenciados, mas a canalização dos 20% foi à três (3) comunidades. “Acções de exploração de florestas está a beneficiar e são cerca de três (3) comunidades, se a memória não me trai, essas beneficiam de 20% de retorno de exploração florestal, e para dizer que todo ano passado 2022 houve canalização dos 20% da exploração madeireira, na Comunidade de Inximpe, Natai e comunidade de Muite”.
Em 2023, segundo explicou João Mezicue ainda não foi canalizado, por alegados problemas bancários dos comités de gestão dos recursos naturais e só depois daí, o Serviço Provincial do Ambiente irá efectuar as transferências para as comunidades indicadas a receber.
“Só este ano ainda não houve canalização destes 20%, isso deveu-se a problemas bancários das comunidades, porque a transição destes valores é feita a nível provincial ou seja pelo Serviço Provincial do Ambiente, é que faz a transferência dos valores para as comunidades, mas, logo que os comités fazem o levantamento as contas ficam sem valores então os bancos acabam bloqueando as contas, agora estamos no acompanhamento desta mecanização destas contas dos próprios comités para levarmos a província para que sejam efectuadas as transições dos valores, refiro-me a canalização dos 20% do corrente ano”, concluiu a fonte. (Redação)
*Reportagem produzida no âmbito do Programa para Fortalecimento do Jornalismo Investigativo com enfoque na Transparência e boa Governação Ambiental – REAJIR
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