Por Estacio Valoi Segunda feira, 24 de Setembro pelo retrovisor deixávamos para trás a cidade de Tete envolta numa vaga de calor, um
Por Estacio Valoi
Segunda feira, 24 de Setembro pelo retrovisor deixávamos para trás a cidade de Tete envolta numa vaga de calor, uma baforada de ar que entorpecia a garganta assim que baixássemos os vidros da viatura em que três pessoas da equipa viajamos a Mphanda Nkuwa la nas margens do rio Zambeze. Uma viagem de cerca de 150 quilómetros de estrada ao ritmo de várias músicas, repetidas sem parar, íamos disputando a estrada apertada com camiões da empresa Lalgy na sua corrida vertiginosa, donos da estrada, para exportar o carvão da Empresa da Jindal de Marara ao porto seco na cidade de Tete.
Pela berma da estrada, indo mais adentro, patente terra faz tempo não sentem o sabor da chuva, o gado esse vai se desenrascando. São mais de trezentas e setenta mil pessoas de dois distritos da província de Tete correm risco de enfrentar défice alimentar segundo uma radio local.
Enquanto seguimos, mais em frente vislumbravam-se torres metálicas, parto de uma nova central elétrica da Cahora Bassa. Cansado de disputar a estrada com os camiões da Lalgy, entramos por uma estrada de terra batida de areia castanha, vermelha a mistura de pedras, uma zona remota de rochas, montes, floresta. Do cume do monte os nossos olhos divagam ate a linha do horizonte. Faz impressão que o carro vai deslizar ravina a abaixo, vestígios da limpeza da madeira feita pelos chineses serteiam divinas, os garimpeiros da zona cavam.
Paramos em Chococoma, nesses poucos minutos encontrei Neli Vicente que foi mostrando-nos as raízes da região, do outro lado da montanha o majestoso rio Zambeze, uma rocha que protege uma caverna onde ficavam os leões espirituais e umas minas outrora abertas na montanha plana num raio de um quilômetro a oitocentos metros de largura onde extraiam ouro e cobre.
O rei Leão era o guardião daquelas terras do Zambeze de leões espirituais e sempre que a comunidade quisesse chuva, prevenir ou curar epidemias “íamos falar com aquele espírito que defendia.” O Rei Leão morreu.
Enquanto as intenções da construção da barragem de Mphanda Nkuwa continuam as comunidades, essas não querem ver e muito menos ouvir sobre o “maldito projecto” e, pedem proteção aos espíritos enquanto continuam à espera de um novo rei -espírito de leão para os defender , proteger, não acreditam mais nas autoridades assim como esperavam a viatura de António Patrício que de longe , olhos postos na montanha da magia de noite viam por vezes luzes , sinais de iluminação de uma viatura em marcha que nunca chega ao centro de Chococoma. Vicente, diz mais, andar de noite é um pouco complicado com o risco de pela caminhada cruzar com fantasmas, duendes e que um curandeiro que era chamado Ximbango, proibia as pessoas de andar de noite, os teimosos ‘levavam porrada.’
São comunidades, mais de 1400 famílias quem tem como fonte sobrevivência a criação de gado, da agricultura e já tem o ouro “na altura não sabíamos que tinha ouro.
O projeto Mphanda Nkuwa o Governo Moçambique rubricou um acordo de parceria para a construção da Hidroelétrica de Mphanda Nkuwa avaliada em 4,6 milhões de euros e terá na sua primeira fase capacidade de até 1.500 megawatts e será a segunda maior Barragem depois de Cahora Bassa.
Foi entregue em maio 2023 a um consorcio liderado pela empresa Électricité de France de que também faz parte as multinacionais Total Energies e Sumitomo Corporation. Os moradores da região onde será construída a barragem de Mphanda dizem que estão a ser impedidos de erguer infraestruturas privadas há mais de dez anos.
A construção desta barragem tem sido alvo de denúncias de violações de direitos humanos e sócio-ambientais. Faz mais de 10 anos as comunidades continuam sendo privadas de construir suas infraestruturas privadas.
Os ambientalistas alertam também para o risco do deslocamento de comunidades inteiras, a destruição dos meios de subsistência de quem vive nos arredores do projeto e graves impactos ambientais nas espécies do rio Zambeze.
Aqui, com ou sem o espírito Leão, a comunidade quer saber de construção nenhuma de barragem e muito menos de reassentamento como o feito pela mineradora Jindal, já lhes basta, “já temos nossos vizinhos, nossos irmãos que estão a sofrer.”
Sem benefício
A dita energia não será para o benefício daquelas comunidades que mesmo estando a 60 quilómetros da barragem de Cahora Bassa, não tem energia elétrica faz décadas, confessam-nos que ouviram dizer uma linha de fornecimento de energia, a semelhança de Cahora Bassa, vai cruzar suas aldeias para a África do Sul, Zâmbia. ‘Se fizerem a barragem vai interromper o curso do rio. Aqui é de Espírito de Leão.’
Enquanto se esperava pela proteção do Rei Leão, ainda em Chococoma, do fundo, surgiam vultos cobertos de plumas negras , corpos acastanhados, reluzentes, banho de lama, missangas, cantavam a cada pé sobre terra, a minha lente rodopiava Lima segredava-me, ‘ São Nyeue” vulgo Gurewankoro, dançam cerimônias, dias festivos no seu ritual antes da dança no cemitério evocam os espíritos dos mortos, poção a mistura a maioria parte das crianças ou jovens não foram à escola são instruídos para tal, dedicam a sua adolescência, juventude e, a escola fica para os outros.
Para trás ficou Chococoma, saimos a estrada principal que vai a Barragem de Cahora bassa , já de tarde voltamos a entrar mas já de Cataxa, Chococoma, Chamimba, mais alem a entrada de Nhamatua reassentamento de Cassoca feito pela mineradora de carvão Jindal, fomos subindo, descendo ravina as margens do rio Rio Zambeze, em Chiúta, Luzinga, Chirodzi – Mphanda Nkuwa, já de tarde, num calor infernal, chegamos e, foi nesta ultima parte em que encontramos a anciã, Dodina Matchesso.
De tanto calor, a socapa tento mergulhar no Zambeze, mas fico pela margem, afinal o rio não só de peixe esta carregado, mas também de crocodilos! Mergulho os pés, queria sentir a água!
De noite na esteira deitado de costa de olhos fitos no céu, a estrela encontrava o “Vénus” planeta da comunicação, cantava-me não mais a ladainha! o cantar do rio, uma paz completa, não havia terça, ou quarta feira, montes Mphanda Nkuwa dormia profundos quando de repetente a voz das comunidades tornou se ensurdecedora. “O regime FRELIMO e os seus amigos Franceses-Banco, TOTAL querem levar nossa terra. Querem nos matar, mas, nós não vamos sair.”
Assim como a idade da Dodina que deve ter cerca de 80 anos, as rugas também foram guardadas pelo tempo, sentada com seus três netos na esteira em Chirodzi diz ela que na altura existia escola nenhuma e assim não pode aprender o B, A, BA! Nasceu, cresceu e casou -se naquela ‘prístina’ com Francisco Morais, detentor gado bovino, caprino, terras.
Na margem do Zambeze, rio de água verdejante, cintilante, e também de Ouro continuamos, firme, quando os bois tentam entrar na sua Machamba, eis que ela de vara na mão de quando em vez com umas pedradas poe as patas do gado em marcha
Na senda das suas peripécias da vida, sempre viveu da natureza de Chirodzi onde produz vegetais, legumes, cebola, tomate, couve e outras verduras. Como diz Dodina, ali tem tudo, não quer a barragem. Nostálgica viaja ao encontro do seu falecido marido, Morais ainda em vida!
Contudo, Dodina as comunidades acreditam que os espíritos ainda residem naquelas terras e não baixam a guarda, perentória, calma diz ‘estas terras são nossas. Vivemos desta natureza.” Ganha força quando se lembra de Morais que enquanto vivo também pós a correr funcionários que pretendiam construir Cahora Bassa. Quando aqui chegavam Morais exibia-lhes as suas grandes terras, plantações e questionava os como ‘e que os estavam a pedir para deixar aquelas terras de abundância para irem viver num lugar desconhecido! “Sinto muita tristeza, muita dor, não quero, não vou sair daqui, estou firme assim como o meu falecido marido estava.”
Exactamente no mesmo local onde outrora quiseram construir a majestática barragem de Chora Bassa, mas os espíritos do Rei Leão não deixaram. Tiveram que lagar tudo e sair em debandada. O rei Leão evocava os espritos, não queriam sentir cheiro de algum de combustíveis. Salienta ‘as pessoas que queriam contruir Cahora Bassa aqui, durante o dia limpavam área, abatiam arvores, mas de noite as mesmas germinavam. acreditavam que eram os espíritos que semeavam essas arvores de um dia para o outro para preservar esta zona de Mphanda Nkuwa.” Triste lembra-se que o Rei Leão que tinha o domínio dos espíritos morreu.”
Surpreendida quando ouvi dizer que na mesma zona mais uma vez pretendem construir uma barragem ‘não sabe o que ira acontecer caso a barragem seja construída.
Em Chirodzi, parte considerável dos jovens deixou a pesca para se dedicar ao garimpo do ouro abundante naquelas terras. Alexandre, jovem de um metro e meio, cabeça meio arredondada, cerca de vinte e sete anos, um dos filhos de Dodina como outros jovens andam todos de sorriso rasgado, o ouro! Alexandre, seus dentes frontais superiores, inferiores foram levados pelo tempo, apenas vê-se a gengiva. Eufórico a mistura da Nipa-Bebida tradicional, mandava suas gargalhadas “vendi ouro, cinco milhões. Amanha volto la no ouro, pesca pode esperar.”
Nesta fase em qua a chuva não se faz sentir, para aquelas comunidades o ouro tornou-se na principal fonte de rendimento. Dodina também beneficia do Ouro.
Entramos em Chiúta- Luzsinga também será afectada caso a barragem venha a ser construída, foi onde encontramos Rui Mário Galmoto, dos seus 60 anos, 8 filhos, 27 netos, ouviu falar da intenção da construção da barragem desde 2000 ate hoje 2024
A narrativa ‘e a mesma “aqui a comunidade não quer ouvir falar da construção da barragem.”
Enquanto sentados, a parca sombra de um Imbondeiro tentava fintar o sol. Outra anciã Paulina, de cerca dos seus 69 anos enfatiza, “será um sofrimento”, aponta o reassentamento feito pela JINDAL ‘uma catástrofe’ perante o olhar do governo, membros da nomenclatura política moçambicana preocupados com comissões, lucros fáceis a troco de vidas humanas e as empresas fazem e desfazem a seu bel prazer. “JINDAL la, tem muito ouro, não ‘e só carvão. Não queremos a barragem de Mpandakua, queremos ficar aqui até nossos netos, nossas netas, até morrermos. Temos uma crise de fome. Mas através do ouro, as pessoas estão tentando sobreviver. Aqui ainda estamos comendo de uma maneira boa, vivendo de uma maneira boa.’
Ela também ‘e garimpeira. Ao mesmo tempo convida-me para já na manha de Domingo juntos irmos ao garimpo do outro próximo da sua comunidade, ‘só atravessar o rio.”
Sem informação/Desinformação
Quer o governo assim como seus parceiros, nada dizem e quando o fazem mais confundem as comunidades que apenas veem “movimento estranho’ são pessoas, barcos, motas de água que passam sobem em direção a Cahora Bassa, descem “Semana passada, antecedendo esta do dia 25 de Setembro passaram 4 motas, ontem dia 24 passaram 2, as quatro que subiram o rio em direção a Cahora Bassa não voltaram.
Soubesse Francisco -Na margem do Zambeze, subimos uma rocha, entre o imbondeiro vimos marcos de GPS que sem conhecimento da população os que pretendem construir barragem foram colocando. SOBE foi pego de surpresa quando ia a sua machamba. Apenas ouviu os sons de uma máquina, não sabia o que era. Quando la chegou percebeu que se trava de um berbequim que os homens que pretendem construir a barragem perfuravam a rocha para montar as coordenadas do GPS. Quanto Zito os questionou o que estavam a fazer, nada explicaram se não que ‘vamos responder depois e tal resposta nunca foi dada.”
Com estes movimentos as comunidades questionam -se sobre o que esta a acontecer, ninguém ‘e informado sobre nada.
Ainda na zona de Chamimba 2 encontramos Steven Azevedo Fernando, um empresário, mas que não sabe que ‘e empresário. La no cume do monte, tem a sua casa, duas moageiras, um pequeno gerador, assiste os filmes, os campeonatos de futebol através da sua antena parabólica branca montada numa esquina da sua casa, tem bois, la também tem ouro, corre água do rio Zambeze através dos seus braços e questiona para onde será reassentando
“Nós aqui temos muitas coisas . Machamba,
‘Boi, horta, Água, madeira, escolas melhoradas, ETC.” Ali vivem cerca de mil famílias. Nesta comunidade o governo e seus parceiros prometeram construir casas para reassentar estas pessoas, energia electrica, mas a comunidade não quer ser reassentada a apela para que as referidas infraestruturas sejam construídas dentro das suas comunidades “construam essas casas aqui onde estamos e não reassentamento. A Cahora Bassa está aqui perto, mas aqui nós não temos energia.”
Em 2012 receberam senhas entregues pelo grupo Consultec, no encontro separam o grupo de mulheres e grupo de homens “Que reunião, essa que separam as pessoas, queriam mentir para nós. Ficaram com nossos contactos” sair daqui como é que vai ser com os bois! Lá no outro sítio, nós vamos sofrer, tirarem daqui para me dar o sítio de lá, perto da estrada. E se talvez esse boi fosse batido com um carro, já ia é quebrar para nós está a ver isso. não queremos sair por causa disso, porque já vimos coisas, o grupo de reassentamento de Cassoca está a sofrer caso de água.
Em Xirimba o mesmo grupo prometeu construir um estacão alto voltaicos ‘painéis solares aqui”?! Silva um dos residentes local questionou-lhes sobre que tipo de energia quando tem Chora Bassa! ‘Não faz sentido”. As comunidades teriam que contribuir para a construção da estacão, “arranjar dinheiro para comprar cabos para ligar dos painéis solares ate as nossas residências!” De 2012, depois da tal discussão, a referida equipa nunca mais la pós os pés!
A semelhança de Moatize, aqui deste lado, também a terra escassa para o reassentamento. A nossa reportagem soube que pessoas da nomenclatura política moçambicana adquiriram grandes extensões de terra para depois negociar com as multinacionais. No reassentamento feito pela JINDAL, quando o porto seco da mineradora esta com muito carvão a espera de ser exportado, param com a produção, a comunidade fica sem água durante três ou mais dias ate exportarem “Porque não estão a produzir fecham a agua, mesmos tubos que também canalizam agua para o centro de reassentamento” assim como o gado das pessoas vai sucumbindo transformando -se numas autenticas carcaças, bebem água das casas de banho reciclada, comem capim infectado pelos químicos. “Ninguém resolve nada! Podemos também vir passar o mesmo como as comunidades reassentadas pela Jindal.” Enfatizou Silva Sadiel Domingos Semblano acrescenta que cerca de 45% das pessoas abandonaram, venderam as casas, cada uma ao preço de 150 mil meticais. “Não há condições para viver!
Na mesma narrativa, Itino Lucas Suague Ruquia, 27 anos pai de dois filhos um casal, rapaz de 5 e uma menina de 2 anos enquanto a chuva não cai, o garimpo do ouro tornou-se numa das principais fontes de subsistência “do ouro, vendo para conseguir sustentar a minha família.”
Enquanto o rei Leão não retorna, as comunidades vão lutando como podem, mas a verdade ‘e uma, não querem barragem por aquelas terras. Sem saber para onde vão, que condições existem, as comunidades são unanimes. “Não vamos abandonar essas terras.”
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